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CIÊNCIA & TECNOLOGIA - Trabalhos Técnicos

Administração, Economia, Planejamento e Política Avícola

Legislação da proteção e do direito dos animais: o reflexo da proposta brasileira para a avicultura

Raquel B. T. R. da Silva - Advogada, mestranda em Engenharia Agrícola, FEAGRI-UNICAMP Irenilza de A. Nääs - Professora Titular Voluntária, FEAGRI-UNICAMP Daniella J. Moura - Professora Doutora, FEAGRI-UNICAMP Neidimila Silveira - Mestranda em Engenharia Agrícola, FEAGRI-UNICAMP

Introdução Os animais têm contribuído historicamente com as condições de benefício e desenvolvimento humanos, desde a época pré-histórica, em termos de alimento, produção de trabalho, e outros propósitos da agricultura, o que está diretamente ligado com a própria história da civilização do homem.
O Brasil tem alojado atualmente cerca de 700 milhões de aves de postura, corte e reprodução, além de um rebanho aproximado de 150 milhões de bovinos de corte e leite e um contingente que gira em torno de 40 milhões de suínos. O país é hoje o maior produtor de carne do mundo, destinando grande parte de sua produção para o mercado internacional.
Face às condições do agronegócio brasileiro ter crescido e companhias exportadoras, com interesse em atender a exigências de normas internacionais, entre outras coisas, os assuntos relacionados ao bem-estar animal, este tema tem hoje importância maior e está sendo discutido no Congresso Nacional um projeto de lei, visando a atualização das normas inicialmente editadas nos anos 20. PROTEÇÃO E DIREITO DOS ANIMAIS O direito, segundo os estudiosos, possui diversas fontes. No Estado contemporâneo, o direito tem origem basicamente na lei ou nos costumes. Contudo, se quem dita o direito é a lei, e a lei e o costume são produtos do homem, teríamos que para cada ser humano haveria uma lei, um costume e conseqüentemente um direito específico. Como então é possível que todos os homens se submetam às mesmas leis e aos mesmos direitos? (Martins, 2001). Em outras palavras como estabelecer os limites do direito dos animais, se não se sabe exatamente qual a sua (deles) exigências ou demandas com precisão. E para garantir estes direitos, como agir para protegê-los?
A primeira iniciativa na legislação brasileira, em âmbito federal, a coibir a crueldade, os abuso e excessos contra os animais que se tem notícias foi o Decreto 16.590, de 1924, que regulamentava as Casas de Diversões Públicas, proibindo as corridas de touros e novilhos, brigas de galos e canários, dentre outras diversões que causassem aparente sofrimento aos animais.
Na década de 30 surgiu o Decreto Lei no. 24.645, de 10-07-1934, onde expunha que todos os animais existentes no país são tutelados pelo Estado, entretanto as poucas normas que regimentam tal tutela nem sempre são conhecidas ou cumpridas.
A Lei 9.605/98 materializou a exigência legal prevista na Constituição Federal (2001), sendo geral para outros temas ligados inclusive ao meio ambiente (flora, fauna, etc). Essa generalidade disfuncional gerou a necessidade de novos projetos de lei que possam subsidiar nos dias atuais, as forma de alojamento, transporte, manejo e demais questões ligadas à produção animal. Da mesma forma, a legislação que protege os animais dentro do conceito de produção do agronegócio, encontra-se obsoleta, enquanto o mercado demanda atualizações. VISÃO INTERNACIONAL A distinção de interpretação entre bem-estar e direito dos animais está na interpretação da sociedade à forma com que são produzidos os animais domésticos. O bem-estar reflete o entendimento que o consumidor dá ao manejo dos animais. Em contraste, o direito propõe a tutela assegurando os princípios básicos de sobrevivência em harmonia com a própria espécie.
Na União Européia, existem normas e legislação específicas, assim como um plano de ação que assegura que as iniciativas no domínio do bem-estar dos animais tenham em devida conta a sua natureza transversal, a sua dimensão e o seu valor no nível internacional, contribuindo para uma melhor regulamentação e servindo à consolidação dos instrumentos legislativos.
Na Austrália e Oceania existem estratégias para a implementação do bem-estar animal, organizadas em forças tarefas, que promovem, discutem e asseguram que sejam cumpridas as normas e legislações específicas, inclusive reconhecendo os valores éticos, culturais, sociais, econômicos e científicos em torno do tema. O PROJETO DE LEI nº 1.647/2003 O Brasil conta hoje com normas adequadas para defesa dos direitos dos animais e para garantir tratamento mais “humanitário” aos mesmos. No entanto estas normas não são inteiramente cumpridas ou mesmo conhecidas e devem incorporar as novas regras internacionais. Desta forma a discussão de uma nova lei de proteção aos animais constitui-se na oportunidade para internacionalização dos novos conceitos de bem-estar, que foram ou estão sendo implementados em muitos países. Embora as regras de comércio internacional não incorporem restrições em relação às práticas de bem-estar animal, estas devem assumir maior importância no processo de diferenciação e competitividade dos produtos e, conseqüentemente, serão alvos de maior rigor por parte dos países desenvolvidos.
A proteção aos animais é um tema de interesse geral da sociedade, que incorpora questões éticas, científicas, econômicas e políticas, tendo estreita relação com produtividade e saúde animal (MAPA, 2005). O projeto de lei de n.1647/2003 vem sendo discutido em audiência pública, no sentido de instituir o Código Nacional de Proteção aos Animais (que prevalece até os dias de hoje), regulamentando inclusive normas para o comércio exterior.
Em países da União Européia existem demandas para a eliminação completa de sistemas de criação considerados de baixo potencial de bem-estar, embora esta transição freqüentemente envolvesse menor produtividade, trazia uma revisão da situação em termos de práticas aceitas e banidas por lei em cada país europeu individualmente. Assim, nas sociedades européias a tendência que era clara de um retrocesso a partir do padrão de produção intensiva extrema, em virtude de considerações centradas no interesse dos animais (McInerney, 2004), foi suspensa parcialmente pelas evidências do aparecimento da Influenza Aviária (I.A.).
O impacto da I.A. nas últimas semanas, nos países do Oriente Médio e Eurásia, indica que a contenção de animais intensivamente e em alojamentos adequados, com certas especificidades, em passado recente, atendia justamente às questões de biossegurança e controle sanitário, não somente para os animais, mas também para os seres humanos. Naturalmente que estes alojamentos devem respeitar os conceitos já definidos como de bem-estar.
O bem-estar animal tem hoje forte presença nos códigos morais e éticos de vários países e um manejo adequado não é mais visto como algo que possa ser deixado para a livre escolha de produtores (Molento, 2005). Uma prospecção de tendências precisa ser considerada, para que os agentes envolvidos possam trabalhar com as melhores hipóteses de acomodação, de maneira que os animais devam ser alimentados, abrigados e mantidos saudáveis até o ponto em que isto compense financeiramente. Em geral, nos países em desenvolvimento, e particularmente no Brasil, a questão de quem vai arcar com os custos de uma melhor qualidade de vida aos animais de produção é, em parte, responsável por uma limitação de progressos nessa área.
Nos anos 1970, houve um grande desenvolvimento da avicultura em muitos países, inclusive no Brasil, levando grande empresas a estabelecerem parcerias no sentido de formar integrações, onde a cadeia produtiva se processa de maneira segmentada. No início do século XX, baseada nas pressões comerciais, cresceu a utilização de aves para produção, em associação com a expansão das necessidades humanas (Singer, 1998). Iniciou-se um sistema de manutenção de animais em altas densidades de lotação, que em algumas áreas existem até os dias de hoje.
Destacam-se no projeto de lei em pauta os seguintes itens, que estariam ligadas às condições da avicultura brasileira:

Capítulo III, Seção III, Do Transporte de Animais: Artigo 16 - É vedado: item II - conservar animais embarcados por mais de 6 (seis) horas sem água e alimento, devendo as empresas de transporte providenciar as necessárias modificações em seu material, veículos e equipamentos, adequando-as às espécies animais transportadas, dentro de 6 (seis) meses a partir da publicação desta lei; ... item IV - transportar animais em cestos, gaiolas ou veículos sem as proporções necessárias ao seu tamanho e números de cabeças, e sem que o meio de condução em que estão encerrados esteja protegido por rede metálica ou similar, que impeça a saída de qualquer parte do corpo do animal;

Na Seção IV: Dos Animais Criados para Consumo; Artigo 18 consta que:

I - privar os animais da liberdade de movimentos, impedindo-lhes aqueles próprios da espécie; II - submeter os animais a processos medicamentosos que levem à engorda ou rescimento artificiais; III - impor aos animais condições reprodutivas artificiais que desrespeitem seus respectivos ciclos biológicos naturais.

Por outro lado, no Capítulo VI; Disposições Gerais e Transitórias,

Artigo 54 - A fiscalização das atividades e a aplicação das multas decorrentes de infração fica a cargo dos órgãos competentes da Administração Pública Estadual, previstos em regulamento, nas suas respectivas de atribuição.

Considerando as distâncias do país continental como Brasil, como ficariam estes procedimentos, principalmente na questão do transporte? Outro ponto conflitante são as condições de alojamento, pois, em sua grande maioria, os galpões são abertos e sem climatização, promovendo altas temperaturas e umidades relativas ambientes, associadas a alta concentração de amônia nas últimas semanas de produção de frangos, por exemplo. CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES A lei é necessária e sua regulamentação deve ser adequada às condições brasileiras, além disso, os Juristas deverão atentar para fatos, valores e normas e evidências científicas de maneira a elaborarem uma lei factível de ser cumprida. Por outro lado, a estrutura atual de fiscalização do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento deverá ter condições de monitorar o cumprimento do substitutivo aqui discutido. Perguntas cabíveis e exercidas pela sociedade e produtores foram elaboradas por Silva (2005), como:

• Quais seriam as dificuldades técnicas especiais no que diz respeito à regulamentação de artigos do projeto da lei? Elas existem e devem ser mais bem discutidas com a sociedade. • A aprovação do substitutivo acarretará aumento de significativo nos custos para a atividade avícola e para o abate nos frigoríficos? Certamente que sim, pois envolve custos operacionais. A questão que fica no ar é quem paga a conta e de que forma serão implementadas essas e inclusive, quais estrategicamente são estas modificações?

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA Albright, J. L. Animal Welfare Issues- A Critical Analysis. Animal Sciences and Veterinary Medicine Lilly Hall, Purdue University West Lafayette, Indiana 47907
BRASIL. Constituição Federal: código penal, código de processo penal/ organizador Luiz Flavio Gomes - 3 ed. rev. atual e ampl - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001 -(RT – mini- códigos)
COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO sobre um Plano de Ação Comunitário relativo à Protecção e ao Bem-Estar dos Animais 2006-2010. COM(2006) 13 final. Bruxelas, 23.1.2006
LEI Nº 11.977, de 25 de agosto de 2005. (Projeto de lei nº 707/2003, do deputado Ricardo Trípoli - PSDB).
Martins, R. F. 2001. Direito dos Animais. Direito e Justiça. Monografia de Conclusão de Curso apresentada na Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. 2001.
McINERNEY, J. Animal welfare, economics and policy: report on a study undertaken for the farm & animal health economics. Division of DEFRA: Londres, 2004.
Molento, C.F.M. Bem-Estar e Produção Animal: Aspectos Econômicos - Revisão. Archives of Veterinary Science, v. 10, n. 1, p. 1-11, 2005. ISSN: 1517-784X.
PROJETO DE LEI No 1.647, DE 2003. COMISSÃO DE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. Autor: Deputado PASTOR REINALDO Relator: Deputado B. SÁ.
Silva, F. J. F. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento Secretaria de Defesa Agropecuária. Documento Apresentado à Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados. AUDIÊNCIA PÚBLICA PARA DISCUSSÃO DO PROJETO DE LEI nº 1.647/2003, QUE INSTITUI O CÓDIGO NACIONAL DE PROTEÇÃO AOS ANIMAIS. Brasília, DF, 09 de junho de 2005
SINGER, P. Ética prática. São Paulo : Martins Fontes, 1998.


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